Acordo com uma vontade enorme de pedalar.
Motivado pela leitura, durante a noite, de aventuras arrojadas de ciclistas que se superam vencendo toda sorte de obstáculos, levanto com a determinação de engajar-me nesta espécie de cruzada de coragem, resistência física e destemor.
Deparo-me, no entanto, já no primeiro momento, com a constatação até aquele momento imprevista de que está chovendo.
Mas, então, digo para mim mesmo, aí está o desafio! Já ouvi a defesa de se pedalar no frio, já comentei até a respeito de pedalar sobre as águas, leio constantemente relatos de pedaladas em desertos, montanhas, sob condições as mais duras, pedalar na chuva sendo assim, é como um passeio.
Reanimado por este pensamento, tomo minha capa emborrachada, de capuz, coloco um calçado impermeável e pronto!, sinto-me apto para curtir uma pedalada sob a chuva.
Pego minha bicicletada e chego ao portão de casa assoviando "Cantando na Chuva".
Na rua, talvez por ser sábado e o dia nublado e chuvoso, pouco movimento.
Poucos carros, apenas alguns transeuntes esparsos passando sob os guarda-chuvas.
Embora a chuva não seja forte, a umidade é muito grande, típica de nossa cidade e, como sempre, desagradável.
Bem, mas só me resta subir na bicicleta e sair pedalando.
É neste momento que me dou conta de que não tenho exatamente um destino.
Moveu-me, até este instante, apenas a vontade de sair pedalando sem maiores considerações.
Agora, no entanto, a falta de um objetivo mais claro, paralisa-me.
Passo a notar também que minha pobre bicicleta não tem nenhum tipo de proteção. Vai ficar molhada e como não tem paralamas as rodas vão jogar água para cima.
Talvez fosse o caso de adotar algum tipo de sistema adequado.
Nada disto, contudo, procuro me convencer, pode me deter.
Nem mesmo o cheirinho de café sendo passado que vem de dentro de casa ou a lembrança de que a lareira ficou acesa.
Por outro lado não consigo me mexer como se estivesse paralisado.
Começo a negociar comigo mesmo um trajetinho bem curto, uma volta na quadra por exemplo. Só para sentir o gostinho de pedalar na chuva.
E é isto que estou pronto a fazer quando levado por um impulso tão súbito quanto o que me fizera tomar a decisão de sair, desisto da idéia e retorno para dentro de casa.
É claro que não estou muito confortável, um sentimento de culpa a percorrer meus pensamentos.
Mas dura pouco.
Ao chegar à cozinha ouço dizer:
- Onde andavas? O café está pronto, vai esfriar... e me agarro, neste momento, à convicção de que agi da forma certa.
Café frio, é preciso convir, não é nada delicioso...
como consegues atingir com tanta precisão um momento? a do “Nem mesmo o cheirinho de café sendo passado que vem de dentro de casa ou a lembrança de que a lareira ficou acesa”, é muito cristalina... muito real... chego a ver a imagem... e o texto final passa uma ideia de cotidiano, mas de um cotidiano cheio de sabor: "Ao chegar à cozinha ouço dizer:- Onde andavas? O café está pronto, vai esfriar... e me agarro, neste momento, à convicção de que agi da forma certa. Café frio, é preciso convir, não é nada delicioso"...
ResponderExcluiralgo que nem parece cotidiano... de tão bonito que fica...
adorei...
.... te agradeço tanta complacência com um ciclista tão titubeante... imagina trocar uma pedalada embaixo da chuva por um cafézinho recém-passado!...
ResponderExcluirPedalar na chuva tem vantagens e desvantagens. Como eu uso oculos, tem
ResponderExcluirmais uma desvantagem !
Mas as piores coisas em se pedalar com chuva moderada, são os motoristas
de dias de chuva. Já notei que por alguma razão incrivel, mais pessoas
saem de casa de carro em dias de chuvas e são pessoas que não aceitam se
molhar nem um segundo sequer.
Isso tem uma justificativa tecnica: Pessoas ligeiramente molhadas em
carros completamente fechados (que estão completamente fechados para não
se molhar ainda mais) ficam com os vidro embaçados - Exceto os com
ar-condicionado.
Com isso, o número de carros subindo na guia para deixar e recolher
pessoas é imenso.
Já assisti cenas dantescas frutos do interesse de não se molhar coletivo!
Outro perigão dos dias de chuva é que o piso fica muito mais
escorregadio, porque o oleo deixado pelos carros se desprende do asfalto
e os buracos (raros nas ruas brasileiras, eu sei, mas vamos supor que
voce está pedalando na Europa) ficam camuflados e para bicicletas com
pneu Jet-Caju como as minhas é um perigão !
Mas por outro lado, tenho otimas lembranças de pedais sob chuva. Algumas
bem fortes (tanto as lembranças quanto as chuvas) .
Me lembro que uma vez fui ao trabalho sob chuva. Não tinha troca de roupa e fiquei o dia todo molhado... Naquele tempo não tinha gripe suina
! :)
Agora o que não consigo aceitar é pedalar com chuva e segurar
guarda-chuva ! Minha coordenação motora não admite tudo isso mais
respirar. É muita coisa. Então dispenso o aerodinamico guarda-chuva !
Abracao...
Samuel
Samuel, obrigado pelas ótimas considerações.
ResponderExcluirNa realidade uma outra crônica no caso de alguém que parece, de fato, mais afeito a pedalar na chuva.
Um abraço
P.R.
Adoro essa despretensão de ser herói. Andar de bike é muito bom, às vezes, é heróico mesmo, mas, convenhamos, somos apenas humanos... e um café quentinho num dia de chuva não dá pra dispensar. Gosto muito de pedalar, mas não sou atleta, e é muito bom compartilhar com pessoas 'normais' esse gostar imensamente.
ResponderExcluirÉ muito bom ler os teus textos, eles têm aquela medida bacana de simplicidade no modo de dizer e profundidade no que dizem.
Valeu!
Pedalar na chuva é delicioso, mas realmente os cuidados devem ser triplicados. O dia que fui atropelado estava chuvendo.
ResponderExcluirPralamas são indispensáveis, assim como, no meu caso que também uso óculos, uma viseira de moto presa ao capacete de bicicleta.
Agora tenho até um capacete exclusivo, com a viseira presa permanentemente e uma touca de banho para a água não escorrer para dentro.
Quanto ao café, eu faço todo dia pela manhã antes de sair de casa, o meu expresso super aquecido, e coloco em uma garrafinha térmica préviamente aquecida, além do café, dois sandubas que virarão torrada, são a carga mínima da minha mochila, ao chegar ao meu trabalho é aquela comilança, sem culpa e cheio de endorfinas.
Olavo, vejo que estás bem preparado para enfrentar a chuva.
ResponderExcluirE invejo a tua disposição de não se deixar intimidar por ela.
No meu caso, contudo,além de não ter tanto preparo, costumo sair só para andar de bicicleta mesmo. Talvez por isto procuro encontrar alguma desculpa, antes de imaginar que sou um frouxo a quem o cheirinho do café que vem da cozinha consiga pôr por terra as decisões ciclísticas mais promissoras.
Um abraço e boas pedaladas sob a chuva.
P.R.Baptista
Paulo...
ResponderExcluirEu pertenço ao Clube do Fotógrafo de Caxias..
Aqui tem um ditado..
"Não existe tempo ruim.. Existe tempo diferente.."
Mas que é brabo pedalar abaixo dos 10 graus.. ah é...
Abraços
Roberto
Caro(a) Ciclista que se aasina "Anônimo" ( portanto, literalmente, um "Ciclista Anônimo).Parece que compartilhamos nossos gostos por ciclismo e um café quentinho.Teu comentário me ajudou a superar um imenso sentimento de culpa, quase de traição,que vinha me incomodando...:)
ResponderExcluirFico agradecido
Roberto, também trabalho com Fotografia, que é uma rica combinação com Ciclismo.
ResponderExcluirSe tens fotos focadas no ciclismo, não queres dar algum link?
Quanto a pedalar no frio e na chuva, parece que há várias interpretações.
Mas enquanto não chego a uma conclusão, vou acompanhando a discussão à beira da lareira... -:)
Quando criança, adorava brincar na chuva. Tão logo começava a 'pingar', eu corria para uma rua próxima de casa, onde brincava de 'engenheira' ou coisa que o valha, fazendo barragens (com pedras) na guia para tentar 'segurar' a água que descia com força das vias centrais. Mas nunca pedalei na chuva; acho que por medo de derrapar... (rsrs)
ResponderExcluirA chuva sempre nos traz evocações... se são evocações de momentos que foram felizes acompanhados de nossas bicicletas, melhor ainda. Não posso esperar,aliás, pela próxima chuva.Começo a achar que não vai haver cafézinho do mundo que me detenha de me molhar...
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